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Final Veredictum: Ex Deo - The Thirteen Years Of Nero

 


O melhor da música pesada é que qualquer período da História pode servir de inspiração para a criação de material. Quer seja um período em específico como a Antiguidade Clássica, a Idade Média, passando pelo Renascimento ou Antigo Regime - qualquer tema serve de inspiração e é nesse sentido que rumamos até ao outro lado do Atlântico para vos apresentar o mais recente trabalho dos Centuriões Romanos do Novo Ocidente, os canadianos Ex Deo.

A banda foi fundada no ano de 2008 na cidade de Montreal no Canadá. Composta por Maurizio Iacono na voz, Stephane Barbe e Jean François Dagenais nas guitarras, Dano Apekian no baixo e ainda Oli Beaudoin na bateria, tem uma discografia toda ela virada para o Império Romano. Os canadianos libertaram ao mundo o seu mais recente trabalho "The Thirteen Years Of Nero", composto por 10 faixas, com o cunho da Napalm Records. Começamos agora a nossa viagem pelo Mundo Romano.

 



Os portões da cidade da Loba e dos Gémeos abrem-se para libertar todo o esplendor da máquina de guerra Romana. Ex Deo começa esta marcha com "The Fall Of Claudius". Depois de uma introdução com o discurso do Imperador Cláudio que foi tirado do filme "I, Claudius" do ano de 1937, pela personagem principal interpretada pelo actor Charles Laughton, a banda liberta a rebelião com Maurizio a soltar um gutural assustador. "Riffs" impiedosos e bélicos comandam a marcha da banda. Os "leaks" das guitarras andam de braço dado com uma bateria que nunca pára nas suas transições. "Double Pedal" é a palavra de ordem e o orquestral utilizado dá um cunho poderoso a este "The Thirteen Years Of Nero". De repente, Ex Deo leva-nos ao passado, até ao centro do Império, para falar de um imperador que tinha tudo contra ele. Para além de ser gago, um pouco surdo e coxo, vivia no meio de um autêntico ninho de cobras ao lado da sua consorte Agripina, que contribuiu ainda mais para a sua ruína. No entanto, falamos de um imperador que desenvolveu os circuitos de distribuição de água em Roma. Com tudo isto, a banda, apresenta um grande, mas grande tema e uma verdadeira entrada a "pés juntos" neste "The Thirteen Years Of Nero".





Depois de uma entrada avassaladora, Ex Deo apresenta a segunda faixa do álbum, aquele que foi o primeiro tema a ser anunciado neste "The Thirteen Years Of Nero", "Imperator". A banda lançou o videoclipe a 14 de Junho 2021 com a cortesia da Napalm Records. Após ter escutado o tema e ter feito o "Track-Attack" para o Not'Abaixo, fiquei a suplicar por mais! Violência levada ao extremo num videoclipe que mostra o quão sórdida e sádica era a mente de Nero! Um tema com "riffs" pesados que mais parecem as passadas das legiões romanas a marcharem por todos os cantos do Império. Uma bateria impiedosa e Maurizio Iacono com um gutural insano a comandar as tropas como um verdadeiro general. O orquestral é também imensamente pesado, embora ilumine um pouco esta escuridão infernal daquele que foi um dos imperadores mais brutais de todo o Império. E ao ouvirmos este álbum começamos a aperceber-nos que este vai ser, como o reinado de Nero, visceral, violento, sádico, sórdido e tirano.





Após termos visto um pouco da carnificina que foi o reinado de Nero, Ex Deo mostra aquela que foi talvez a principal razão pela qual este imperador ficou conhecido como um dos mais sanguinários de toda a dinastia imperial. Em "The Head Of The Snake", a banda arranca a todo o gás até desacelerar para Maurizio Iacono usar o seu lado mais grotesco. Oli Beaudoin coordena a bateria que cria uma devastação infindável, transições brutais, com "blast beats" e momentos de "double pedal" viscerais como o trespassar de lâminas em corpos indefesos. Os "riffs" das guitarras e do baixo também são bastante pesados. Com uma rapidez e técnica estonteantes, estes instrumentos partilham com a bateria a sensação de agressão e matança sem precedentes. Como referi no início, "The Head Of The Snake" mostra uma das razões pelas quais Nero pode ter ficado demente: Agripina, sua mãe, tinha uma mente tão sórdida e sanguinária como a do filho. De acordo com a História, terá sido ela quem matou o Imperador Cláudio envenenando-o. A letra fala em como a influência de Agripina sobre Nero fez com que este matasse o seu irmão mais novo e ainda a mãe anos mais tarde. Mais uma enorme pedra neste "The Thirteen Years Of Nero". 





"Boudicca (Queen Of The Iceni)" é o quarto tema deste álbum e conta com a participação de Britney Slayes dos “Unleash The Archers”, banda que estava anunciada para o Vagos Metal Fest, mas que devido à pandemia tem vindo a ser adiada a sua edição (pode ser que confirmem novamente para 2022). A banda lembra como Boudicca, a rainha dos Icenos (povo Celta que habitava na Britânia), liderou os seus exércitos contra a invasão Romana. O tema começa com um orquestral soberbo, culminando em "riffs" bastante melódicos, mas o melhor são as transições na bateria e apercebemo-nos que Oli tem duas metralhadoras nos pés (coisa que naquele tempo não existia). Os "riffs" e as transições acabam assim que Maurizio, na sua grandeza, declara a vontade do imperador Nero em anexar a província da Britânia. O tema é bastante melódico com algumas variações de intensidade e velocidade. Apercebemo-nos que o registo vocal de Maurizio altera para se assemelhar a um comandante que guia e comanda as tropas num campo de batalha alertando-os para o perigo do inimigo, mas ao mesmo tempo enaltecendo-o. Britney Slayes entra na última parte do tema utilizando o seu poderio vocal. Quem não conhece “Unleash The Archers” aconselho vivamente a ouvir, pois não se irá arrepender. Um bom tema neste "The Thirteen Years Of Nero" e uma parceria excelente no que toca às vozes. De um lado um gutural sombrio e bélico, e do outro uma voz feminina intimidatória e poderosa!





"Britannia: The 9th At Camulodonum", fecha a primeira metade deste álbum e posso dizer que até agora ainda não tive tempo para respirar. Este tema parece uma espécie de prequela do anterior já que em "Boudicca (Queen Of The Iceni)" falava na batalha entre os Romanos e os Icenos, o 5º tema fala na conquista de Camulodunum, a primeira cidade romana da Britânia que foi conquistada pelo Imperador Cláudio e que depois foi varrida pelos exércitos de Boudicca. Um tema que mais uma vez mostra o quão forte era a máquina de guerra romana. O "riff" inicial da banda tem uma introdução com uma mistura eletrónica, mas rapidamente tudo muda quando entra a voz. Um orquestral arrepiante. Constantemente a ouvirmos o som de cordas, a banda altera para instrumentos de sopro, mostrando que o ataque está eminente. "Riffs" mais graves e espaçados culminam com uma bateria a ter variações brutais em que mais uma vez o "double pedal" está presente. Um tema que fala numa invasão iminente e em que a destruição e aniquilação estão próximas.





Depois da devastação, do derramamento de sangue, mortes, derrotas e conquistas, Ex Deo quebra a intensidade para nos dar um tema instrumental. Tudo o que fazemos em vida irá ser julgado e discutido após a morte. "The Trial Of The Gods (Intermezzo)" abre a segunda metade deste "The Thirteen Years Of Nero" com um orquestral pesado e apaixonante. Com uma cinemática brutal, a banda prepara os ouvintes para uma segunda metade de um álbum que até agora tem sido um autêntico deleite para os fãs da música pesada. 






"The Fiddle & The Fire" começa com uma sonoridade que nos faz voltar atrás no tempo. Um som que se assemelha aos instrumentos utilizados no antigo Império, a banda utiliza um "riff" mais límpido e leve assim que as guitarras distorcem, fazendo deste talvez o tema mais melódico deste "The Thirteen Of Nero". O gutural utilizado culmina num orquestral melodioso que tem uma das variações mais arrebatadoras deste álbum. Como uma balada destruidora, Ex Deo fala naquele que talvez tenha sido o maior genocídio da Antiguidade Clássica - o incêndio de Roma provocado por Nero - e que segundo a lenda o próprio Imperador tocava lira enquanto a zona do Circus Maximus ardia. Mais tarde o imperador culpou os Cristãos de tal atrocidade e mandou matar grande parte das pessoas que cultuavam a religião menor que tinha surgido há poucas décadas no Império.





Depois da calmaria vem a tempestade... Isto devia de ser ao contrário, mas Ex Deo primeiro liberta a fúria, acalma os ânimos e depois volta a envolver tudo numa tempestade sem fim. Em "Son Of The Deified" ouvimos uns rufos iniciais que anunciam a morte de alguém em praça pública. A banda mostra-nos um lado mais denso e pesado onde a melancolia nos abraça para um tema que tem uma violência instrumental avassaladora, e que mais uma vez explora todo o sadismo de Nero. Num tema em que a letra fala em como Nero solicitou conselhos a Séneca - o filósofo romano que foi o tutor do Imperador quando este era um jovem. O tema fala também em como o Imperador se revolta contra o senado Romano e como este o vai declarar inimigo público de Roma. O orquestral deste "Son Of The Deified" é tão pesado como é negro, pois envolve quem ouve numa espiral descendente. Momentos de "double-pedal" onde a bateria acelera e desacelera conforme o compasso e ainda "riffs" tão melancólicos que se misturam com o orquestral dando uma ambiência lúgubre e diabólica. Outro destaque deste tema é, sem dúvida, o solo. Brilhante, melodioso e contrastante com o negrume do tema, um pedaço de luz nesta composição onde a escuridão é a rainha e senhora.





"What Artist Died In Me..." é o nono tema deste "The Thirteen Years Of Nero" e o fim está quase aí à porta. Ex Deo mostra como o Império se voltou contra o seu líder e como este faz uma introspeção e pensa que o seu direito de imperar lhe foi atribuído pelos deuses. Um tema que mostra uma mente em declínio e que a nível instrumental mostra um lado vertiginoso com momentos de pura loucura. "Riffs" mais pesados e alucinados misturam-se com uma bateria cujas variações de intensidade fazem com que este "What Artist Died In Me…" seja apenas um devaneio de alguém que entrou numa espiral descendente e que se tornou no maior veneno de uma população inocente e de uma máquina de guerra que por onde passasse deixava vincado o seu cunho de destruição e de conquista.





A banda fecha este álbum com "The Revolt Of Galba". Ex Deo é como se fosse uma Legião Romana que chegava, via e vencia - tal como em latim "veni vidi vici". Visceral, destruidora e triunfal é a forma como estes canadianos encerram "The Thirteen Years Of Nero". "The Revolt Of Galba" é o último tema e mostra-nos como um imperador virou um inimigo e prontamente se montou uma verdadeira caça ao homem. Um gutural impiedoso, aliado a um orquestral destrutivo mostram o surgimento de um governante de uma província romana que acabou por se tornar Imperador. "Riffs" mais melódicos associados a uma bateria que mais uma vez usa a sua técnica impiedosa para dar um peso brutal a um tema. Existem alguns momentos em que, no meio da distorção do orquestral e do gutural cavernoso, surge um som de teclas divinal e a banda transita para a última parte deste "The Revolt Of Galba" com um momento de cordas magistral que dão uma falsa luz ao tema que termina de uma forma abrupta. Magnífico Ex Deo.



  







Mais uma vez o YouTube a fazer das suas e a sugerir coisas que nunca tinha ouvido e que são um verdadeiro deleite para os meus ouvidos! Tal como César atravessou o Reno construindo com os seus soldados pontes em madeira e as destruiu dizendo que "a águia romana sobrevoa e conquista tudo por onde passa.", Ex Deo chega e arrebata tudo com este "The Thirteen Years Of Nero". Doentio, visceral, insano e pesado, é aquilo que se escuta ao ouvir-se este trabalho dos canadianos. Maurizio Iacono numa entrevista antes do lançamento desta autêntica pedra tinha dito que os fãs podiam ficar descansados que este seria um dos lançamentos mais pesados feitos pela banda e cumpriu. Um álbum com "riffs" cujo peso parece uma homenagem às legiões a marcharem nos campos de batalha. Destrutivos e imperiais dão um cunho bastante impiedoso a quem ouve. A bateria também ela é uma autêntica máquina de guerra. Com diversos "blast beats" que ficam no ouvido, Oli Beaudoin faz deste álbum um verdadeiro parque de diversões para o "double pedal", e parece mesmo que o baterista tem uma autêntica arma de cerco. "The Thirteen Years Of Nero" é uma prova que o "Death Metal" está vivo e transpira saúde. Ou muito me engano, ou este álbum dos canadianos arrisca-se a ser um dos melhores de 2021. Quem ainda não o tem na coleção pode ir já buscá-lo e aprender um pouco sobre aquilo que foi Roma e o seu Império, pois este sucessor de Calligvla é um verdadeiro murro no estômago e uma bruta entrada a pés juntos para aqueles que procuram um bom motivo para ouvir música pesada.