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Xplore The Classic: Moonspell - Wolfheart

 


A herança que nos foi transmitida pelos nossos antepassados reflete-se na nossa História enquanto povo e enquanto Nação. Sempre foram acusados dentro do seu próprio país de terem vendido a “Alma ao Diabo” e cantarem em Inglês, mas a verdade é que os Moonspell durante toda a sua discografia, sempre implementaram elementos que fizessem alguma espécie de referência à cultura portuguesa e ainda aos tempos pré-romanos durante a existência da Lusitânia.

Editado há 25 anos, hoje falamos daquele que é o melhor e maior álbum de música pesada feito em Portugal, “Wolfheart”. E a verdade é que em 30 anos de existência nenhum outro álbum de Moonspell consegue chegar ao alcance deste verdadeiro "Santo Graal" da música pesada feito em terras de Camões.




1995 foi o ano de lançamento desta autêntica "jóia da coroa" e na altura ninguém sabia que hoje, em pleno 2021, Moonspell seria uma das pedras basilares do Heavy Metal português. “Wolfheart” é um álbum onde podemos ver a escuridão das trevas, o medo, o folclore pagão lusitano e onde o Gótico é o senhor supremo da melodia e da composição. Começamos este álbum com "Wolfshade (A Werewolf Masquerade)". É neste tema que os elementos da banda assumem a forma dos bravos lobos lusitanos que deram ao mundo o seu coração e fizeram deste álbum uma peça de culto! Assim que começamos a ouvir este tema, temos aquela sensação de caminhar num pântano, enquanto que o medo caminha atrás de nós num tom sinistro e onde os acordes de guitarra adensam a escuridão da noite à medida que avançam na composição. Assim que ouvimos a distorção dos instrumentos, ouvimos um grito diabólico de Fernando Ribeiro que anuncia a chegada da noite e com ela um ser demoníaco que assume a forma de um lobo que nada trará a não ser desgraça e destruição. Falamos de um tema com "riffs" bastante pesados e graves e onde a bateria segue a mesma linha, no entanto tudo se transforma assim que ouvimos o solo de "Wolfshade (A Werewolf Masquerade)", bastante melodioso e luminoso, um pedaço de luz num pântano vazio onde a escuridão impera. 



Num tema que varia a nível de rapidez e intensidade temos "Love Crimes". Aqui o tom sinistro dá lugar a "riffs" rápidos e mais crus, que se desvanecem no refrão. Neste tema o gutural de Fernando Ribeiro passa de um lado mais animalesco para um tom mais límpido, grave e intenso. O músico quase que declama o refrão num sofrimento profundo. É também no refrão onde sentimos que a bateria desacelera o compasso e conseguimos perceber que as pancadas se misturam com uma voz feminina que parece que acompanha o sofrimento do vocalista. Assim que entramos na segunda parte começamos a ouvir o baixo que parece que acompanha esta balada infernal. Os teclados antecedem o solo e acompanham o último refrão. O tema acaba numa declamação profunda da última parte da letra. Com um solo que fica no ouvido, este tema tem um lado apaixonante, mas também sinistro. Um tema que fala na morte como um ritual de acasalamento em que os envolvidos podem ser atraídos para o abismo e infortúnio, tal como a viúva negra com o seu companheiro.





Voltamos a andar por caminhos pantanosos em "... Of Dream And Drama (Midnight Ride)". O "riff" inicial é assustadoramente brilhante. Assim que começamos a ouvir Fernando Ribeiro apercebemo-nos que iremos caminhar noite dentro e que o amanhecer não irá aparecer tão cedo. Este tema é um daqueles onde o Gótico caminha de mão dada com o negrume da escuridão. "Riffs" profundos e negros, um baixo que acrescenta ainda mais negrume, fazem deste "...Of Dream And Drama (Midnight Ride) a tríplice perfeita para começar este "Wolfheart". Outra coisa a salientar neste tema são as teclas que acrescentam o pesar e o lúgubre a esta composição noturna e maldita... mais um tema que fala na atração fatal que nos pode levar à morte.




Se nos primeiros três temas deste álbum temos tons lúgubres que nos levam ao recôndito do pensamento e nos deixam ficar acordados à noite tal é o negrume das composições e ainda a presença de elementos de "Black Metal", em "Lua D' Inverno" começamos a pressentir o lado folclórico e pagão do nosso país. Este é um tema instrumental em que apenas se ouve a viola e ainda uma flauta. "Lua D' Inverno" é a herança dos povos que ajudaram a formar a nossa nação. É como um chamar dos velhos Deuses aquilo que se ouve. É um tema que bem poderia ter cinco ou mais minutos e não se tornaria aborrecido, antes pelo contrário. Dá vontade de saltar à beira das fogueiras ou ouvir as histórias que se contavam aos nossos pais e avós quando estes eram pequenos e ficam na tradição oral de um povo.




Até ouvir este álbum desconhecia por completo a existência de um panteão Lusitano. Eu que gosto imenso de História e de Mitologia, estava completamente às escuras no que toca aos Deuses Lusitanos até que ouvi este "Wolfheart". Comecei a pesquisar e a ler mais sobre o paganismo Lusitano e eis que Moonspell nos presenteia com "Trebaruna". Trebaruna era uma Deusa cujo culto estava ligado ao lar, à família, ao pensamento, à protecção e à batalha. O tema tem tanto de Folclore como de "Heavy Metal". Os "riffs" das guitarras, os ritmos criados pela bateria e ainda o baixo dão um cunho mais pesado a um tema que tem como fundo um som que nos remete para as Beiras, Trás-os-Montes e ainda para o Minho. O primeiro tema, todo ele cantado em português neste "Wolfheart".




Depois de um pouco de luz e de folclore pagão, volta a anoitecer e o tom fúnebre cai sobre o mundo num ritual trazido da Transilvânia. Moonspell idolatra o monstro que fez com que autores como: Anne Rice ou até mesmo Bram Stoker fizeram fama. Em "Vampiria" não vamos para os campos pantanosos com a lua de prata a iluminar-nos o caminho, mas sim directamente para os terrenos profanos dos cemitérios. Como de um ritual se tratasse vamos descendo até às criptas subterrâneas neste tema. Os coros femininos, o baixo, a bateria e o órgão dão a sensação de estarmos a acordar um monstro que cultua o folclore medieval europeu, o vampiro. A voz de Fernando Ribeiro tem um tom arrastado, intenso e demoníaco com um sotaque que nos remete para a região dos Cárpatos onde se situa a infame região da Transilvânia.





Cultuando uma vez mais o feminino, temos "An Erotic Alchemy". Este tema quase que parece uma sequela de "Love Crimes", mais uma vez temos um baixo que pauta a melodia perigosamente apaixonante. O tom de Fernando Ribeiro tem um lado "clean" mas muito negro, que se mistura com os coros e ainda uma voz feminina que dá um tom atraente a quem ouve. Podíamos literalmente comparar este tema ao canto das sereias ou ainda ao mito da esfinge. As sereias que atraíam o homem pela voz e a esfinge que procurava no homem a inteligência e quando esta não aparecia, a morte era o caminho certo para quem não estivesse à sua altura. Com uma bateria exemplar que parece pactuar com o baixo neste ritual profano, temos uma conexão perfeita entre estes dois instrumentos. O órgão tem também um papel preponderante neste tema, já que dá um tom mais sombrio e tenebroso à letra. 





Arrebatadora, emotiva, motivo de orgulho e que causa aquele aperto no coração quando escutamos a letra é "Alma Mater". Este é sem dúvida o melhor e mais significativo tema de "Wolfheart". Desde a primeira palavra até à última vemos o nome de Portugal espelhado neste tema. Desde o passado lusitano até à fundação do território, o passado pagão, passando pelos descobrimentos ou até à célebre citação de Salazar "orgulhosamente sós". Este tema bem que podia ser um "hino" alternativo à "A Portuguesa". A nível musical, nada a apontar. Temos o órgão que são o porta estandarte desta "Alma Mater, o baixo tem momentos entre os "riffs" que roda num tom mais alto e é bem perceptível durante todo o tema. Com variações de intensidade e ainda "blastbeats" magistrais, fazem com que a bateria também se destaque neste tema e parece que vemos todos os instrumentos a irem atrás desta. "Riffs" harmoniosos também fazem parte de "Alma Mater" e ainda ouvimos um gutural audível com um refrão cantado em português onde Fernando Ribeiro enaltece toda uma nação que tenta projetar no futuro as vitórias e a fama do passado.




Para encerrar este "Wolfheart", voltamos ao lado folclórico e ao paganismo lusitano. Desta feita Moonspell venera a deusa da fertilidade e da primavera lusitana, "Ataegina". Tal como em "Trebaruna", este tema é todo ele cantado em português. Mas enquanto que em "Trebaruna" temos uma letra dividida em duas partes, em "Ataegina" temos um refrão em latim. Uma flauta abre o tema e um toque da caixa, dá lugar aos "riffs" melodiosos e vivos das guitarras. A bateria acompanha com a mesma intensidade e vivacidade das guitarras e do baixo. A voz também é algo a destacar. Parece mesmo um tema que pode servir para uma festa pagã onde muitos se reúnem à fogueira para beber uns "canecos" enquanto se canta e dança com esta festa de celebração à Deusa "Ataegina". O tom deste tema a par com "Trebaruna" são a luz contrastante no negrume deste "Wolfheart".









Os anos passaram-se e a banda consolidou-se como o nome maior do Heavy Metal feito em terras de Camões. O seu trajeto internacional é inegável e após o lançamento de "Wolfheart" muitos foram os álbuns que a banda lançou. Com um lado negro e cavernoso, a banda mistura o "Black Metal" com o Gótico às suas composições e a noite abraça-nos com o seu lado mais primitivo. As guitarras têm "riffs" melancólicos, pesados e intensos. A bateria com as suas imensas variações de intensidade mostra o quão calma pode ser a noite, como também pode ser letal e medonha para aqueles que a temem. O órgão exibe todo o seu horror e o tom pesado e lúgubre faz com que a escuridão se adense ainda mais para quem ouve. O gutural cavernoso e as variações límpidas, mas intensas na voz de Fernando Ribeiro prendem-se com a composição instrumental. Existem momentos em "Wolfheart" que ao fecharmos os olhos sentimos uma sonoridade parecida com Type-O Negative e quase que ouvimos Peter Steele ao leme destes bravos lusitanos. "Wolfheart" é um álbum que merece destaque na coleção de qualquer fã de música pesada, seja em que versão for; Cassete, Vinil ou CD. Este álbum tornou-se um álbum de culto e enche qualquer fã de Heavy Metal de orgulho, no caso deste ser português, ou num objeto de veneração, caso não seja português.